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“Ciências Exatas Contemporâneas”, de autoria de Superdotado Álaze Gabriel.
Disponível em http://www.cienciasexatascontemporaneas.blogspot.com.br/
Autoria:
Ronaldo Pereira Campos. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
– PUC-SP.
INTRODUÇÃO
Ao ingressar
no ensino superior, os estudantes da área ciências exatas se deparam com a
disciplina de Cálculo Diferencial e Integral (CDI) como curso básico para
vários outros. De acordo com Candido, Monteiro e Barufi (2004), espera-se que
essa disciplina, por meio de vários tipos de problemas, propicie aos alunos uma
visão mais ampla de como o conhecimento matemático pode ser articulado. No
entanto, o processo de ensino e aprendizagem CDI é desenvolvido na maioria das
vezes sob a forma de: definições, teoremas, propriedades, exemplos e exercícios
(Melo 2002), em que o aluno é levado ao fracasso e ao abandono desta importante
disciplina, fundamental nos primeiros anos dos cursos de ciências exatas. A
forma como o professor aborda esse tema pode desmotivar o aluno, dada à
importância ao uso das técnicas e reprodução de situações do tipo “calcule”,
“determine” sem dar um significado ao porquê das construções, algoritmizando
demasiadamente o assunto como um todo.
Segundo
Baldino (1995), as disciplinas de Cálculo: “São
as disciplinas internacionalmente reconhecidas como as de maior dificuldade
para os alunos, onde os índices de reprovação são os mais altos”. O autor
ainda escreve que existe uma preocupação crescente por parte de educadores em
Educação Matemática voltados aos cursos de Cálculo.
Nos últimos
anos, foram feitas pesquisas visando diagnosticar causas das dificuldades
apresentadas no processo de ensino e aprendizagem do CDI, bem como tentando
buscar soluções lançando mão de tecnologias facilitadoras de aprendizagem dos
conceitos tratados nessa disciplina. Vários softwares e seqüências de ensino
têm sido criados e usados na Educação Matemática, porém o livro didático ainda
continua sendo amplamente utilizado como referencial para professores (Silva
2004).
Um dos temas
centrais do CDI, e foco dessa pesquisa – o Teorema Fundamental do Cálculo (TFC)
– estabelece a importante conexão entre Derivada e Integral (Lima 2002),
conceitos ensinados geralmente de forma independente. O primeiro, ligado ao
problema de se determinar a reta tangente a uma curva em um ponto, enquanto o
segundo, ligado ao problema para se encontrar a área de uma figura plana. Apenas aparentemente, entre os dois
problemas parece não existir relação.
Neste
trabalho, enfocamos o Teorema Fundamental do Cálculo (TFC) como objetivo da
pesquisa, e para isso, analisamos como 4 livros didáticos tratam esse
importante teorema do Cálculo. Para isso, verificamos quais as diferenças
fundamentais são evidenciadas no enfoque dado pelos diferentes autores, e, além
disso, com base nos Registros de Representação Semiótica de Raymond Duval, tentamos
identificar os tratamentos e conversões
dos registros presentes nos textos desses livros, por constituírem um
instrumento sempre presente no trabalho do professor na sala de aula.
Para buscar
respostas, tanto para a escolha quanto para a organização da análise dos livros,
utilizamos alguns princípios inspirados e adaptados do livro “Análise de
Conteúdo” de Bardin (2003), que sugere esta organização por meio de três etapas:
a pré-análise; a exploração do material e o tratamento dos resultados obtidos e
interpretação.
REFERENCIAL TEÓRICO
Para orientar
a nossa análise, baseamo-nos na Teoria dos Registros de Representação Semiótica
de Raymond Duval. Segundo o autor, sua teoria é utilizada na aquisição de
conhecimentos matemáticos.
A comunicação
em matemática se estabelece toda por meio de representações. De acordo com Damm
(2002), os objetos a serem estudados são conceitos, propriedades, estruturas,
relações que podem expressar diferentes situações, portanto, para seu ensino
precisamos levar em consideração as diferentes formas de representação de um
mesmo objeto matemático. Para estudar a aquisição de conhecimentos matemáticos,
é preciso então recorrer à noção de representação. Como a matemática trabalha
com objetos abstratos, e estes não são diretamente acessíveis à percepção,
necessita-se para a sua apreensão o uso de uma representação.
Segundo Damm
(2002), Duval estabelece três aproximações da noção de representação:
·
As representações mentais que têm a função de
objetivação e o método para seu estudo é o da conversão;
·
As representações computacionais que são
internas e não conscientes do sujeito. Estas privilegiam o tratamento,
traduzindo informações externas a um sistema, sob uma forma que seja possível
recuperá-las e combiná-las no interior do sistema;
·
As representações semióticas que são externas e
conscientes do sujeito. São relativas aos signos, linguagem natural, língua
formal, escrita algébrica, gráficos cartesianos, figuras, de um objeto
matemático.
As
representações semióticas realizam, de maneira indissociável, uma função de
objetivação e uma função de tratamento, além da função de comunicação. Essas
representações semióticas têm dois aspectos: a sua forma (o representante) e o
seu conteúdo (o representado).
Apesar de as
representações semióticas estabelecerem a comunicação em matemática, elas são
necessárias também para as atividades cognitivas do pensamento, ou seja, sem as
representações semióticas não é possível efetuar certas funções cognitivas
essenciais do pensamento humano. Essas atividades cognitivas, requeridas pela
matemática, devem ser procuradas, segundo Duval (2003), nas duas características
seguintes:
1) A
importância das representações semióticas – Essa importância se deve a duas
razões fundamentais: primeiro – as possibilidades de tratamento matemático
dependem do sistema de representação utilizado. Por exemplo, fazer a translação
de uma parábola no sistema de eixos cartesianos ortogonais é uma forma de
tratamento gráfico. Segundo – os objetos matemáticos não são diretamente
perceptíveis ou observáveis. O acesso a esses objetos está ligado à utilização
de um sistema de representação.
2) A grande
variedade de representações semióticas utilizadas em matemática – São sistemas
de numeração, figuras, escritas algébricas e formais, representações gráficas e
a língua natural.
De acordo com
Damm (2002 p. 144), Duval enfatiza três atividades cognitivas fundamentais
ligadas à apreensão ou produção de uma representação, ou seja, para que um
sistema semiótico possa ser um registro de representação é necessário: a
formação de um a representação identificável, o tratamento e a conversão.
·
A formação de uma representação identificável –
Esta pode ser estabelecida através de um enunciado compreensível em uma
determinada língua natural, através do desenho de uma figura geométrica,
através da escrita de uma fórmula, de um gráfico, etc. A formação de uma representação
identificável depende de regras que garantam o reconhecimento das
representações e a possibilidade de sua utilização para tratamento. Essas
regras já estão estabelecidas na sociedade, cabendo ao sujeito usá-las para
reconhecer tais representações.
·
O tratamento de uma representação é a
transformação dessa representação no próprio registro onde foi tomada, ou seja,
é uma transformação interna a um registro. Por exemplo: a translação é um tipo
de transformação interna ao registro gráfico; o cálculo algébrico; a
reconfiguração é um tratamento para as figuras, etc. Existem regras de
tratamentos próprias a cada registro, e elas variam de um registro a outro. Os
tratamentos são ligados a forma (o representante) e não ao conteúdo do objeto
matemático.
·
A conversão de uma representação é a
transformação desta em uma representação em outro registro, conservando os
mesmos objetos denotados. Por exemplo: passar da língua natural à escrita
algébrica, ou então, passar do registro de representação tabela ao registro de
representação gráfico, etc. Lembrando que registros diferentes possuem formas
de tratamento diferentes.
Salientamos
que a conversão intervém para escolher o registro no qual os tratamentos a
serem efetuados são mais “econômicos,
mais potentes” (Ibid., p. 16), ou para obter um segundo registro que serve
de base aos tratamentos que se efetuam em um outro registro, sendo assim, um
complementaria o outro. O autor ainda escreve que a conversão não tem nenhum
papel intrínseco nos processos matemáticos de justificação ou prova, porque
eles se fazem com base em tratamentos efetuados em um determinado registro
discursivo (figura 1). Do ponto de vista cognitivo é a conversão que aparece
como atividade de transformação fundamental, que segundo Duval “é aquela que
conduz aos mecanismos subjacentes à compreensão” (Ibid., p. 16).
O problema no
ensino de matemática se estabelece justamente porque só se levam em
consideração as atividades cognitivas de formação de representação e os
tratamentos necessários em cada registro. Porém, o que garante a apreensão do
objeto matemático não é a determinação de representações ou as várias
representações possíveis de um mesmo objeto, mas sim a coordenação entre estes
vários registros de representação. Devemos não confundir o tratamento com a
conversão.
O objeto
matemático não pode ser identificado com o conteúdo de sua representação. A compreensão em matemática requer a coordenação dos registros, ela
está ligada ao fato de dispor de ao menos dois registros de representação
diferentes. Essa é a única possibilidade de que se dispõe para não confundir o
conteúdo de uma representação com o objeto representado. O autor conclui que para analisar as
dificuldades em matemática, é preciso estudar prioritariamente a conversão das
representações e não os tratamentos, pois a capacidade de converter implica a coordenação de registros.
Pode-se notar na obra de pesquisadores a
importância dada pelos mesmos à análise de texto. Escrevem que os livros
didáticos exercem influência no processo de ensino e aprendizagem, e sendo
assim, poderiam (ou não) favorecer uma visão mais articulada da matemática,
mostrando a dinâmica de sua estrutura e a história dos seus sujeitos e objetos, e que o modo de organização e a
qualidade de conteúdos tratados
poderiam facilitar o trabalho pedagógico. A base do conhecimento do leitor é muito importante, porém a estrutura do
texto pode facilitar ou dificultar sua compreensão, no que concerne ao êxito da
leitura.
Entendemos que o
livro didático em geral é fundamental para muitos professores. De acordo com
Barufi (1999), a escolha do livro pelo professor pode direcionar de alguma
forma, a maneira como o aluno irá aprender uma determinada noção. Compreendemos
que aquisição de conhecimento por parte do aluno, através do seu livro, pode
ser mais bem articulada se os registros de representação forem utilizados
adequadamente. Por isso, para nortear o trabalho, utilizamo-nos dos Registros
de Representação Semiótica de Duval, que trata de aspectos cognitivos
relacionados com a aquisição desses conhecimentos matemáticos.
Devido à relevância do tema, ao crescente
número de trabalhos de pesquisa em análise de textos e com base em Duval,
levantamos uma questão: Como o TFC é tratado em livros didáticos? Tentaremos
analisar essa questão respondendo: Que diferenças fundamentais são evidenciadas
no enfoque dado por diferentes autores? A coordenação dos registros de
representação é explorada pelos autores na apresentação do TFC?
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para tentar
responder às questões levantadas anteriormente, analisamos como quatro livros didáticos tratam o Teorema
Fundamental do Cálculo – a saber:
·
Curso de
Análise – Volume 1, de Elon Lages Lima
·
Um curso
de Cálculo – Volume 1, de Hamilton Luiz Guidorizzi
·
Cálculo
– Volume 1, de James Stewart
·
Cálculo:
um curso universitário – Volume 1, de Edwin. E. Moise
Para a
organização da escolha e da análise das quatro obras referidas acima,
utilizamos alguns princípios inspirados e adaptados do livro “Análise de
Conteúdo” de Bardin (2003). Essa organização é sugerida cronologicamente por
meio de três etapas que seguem: a pré-análise; a exploração do material; e o
tratamento dos resultados obtidos e interpretação.
·
A PRÉ-ANÁLISE: é a fase de organização
propriamente dita. Tem por objetivo tornar operacionais e sistematizar as
idéias iniciais. Segundo a autora, “trata-se
de estabelecer um programa que, podendo ser flexível/ [...], deve, no entanto,
ser preciso” (Bardin 2003, p. 95). A pré-análise consiste de três fases: a
escolha dos livros didáticos; a formulação de hipóteses (neste trabalho não
temos a intenção de seguir uma hipótese); e a elaboração de indicadores que
fundamentem a interpretação final.
·
A
EXPLORAÇÃO DO MATERIAL: A autora escreve que se as operações da pré-análise
foram adequadamente concluídas, a fase de análise propriamente dita “não é mais do que a administração
sistemática das decisões tomadas” (Ibid., p. 101). No caso da nossa
pesquisa, após leitura minuciosa, fizemos a transcrição de partes
representativas dos capítulos que tratam do Teorema Fundamental do Cálculo e
noções ligadas a ele, como definições, outros teoremas, exemplos e comentários
para a efetivação da análise através dos indicadores.
· TRATAMENTO DOS RESULTADOS OBTIDOS E
INTERPRETAÇÃO: nessa etapa os resultados “brutos” devem ser tratados de maneira
a serem significativos e válidos por meio de operações estatísticas simples que
permitem estabelecer quadros de resultados, padrões e modelos, os quais
condensam e colocam em destaque as informações da análise.
Para a análise
propriamente dita destes livros, no que diz respeito ao TFC, utilizamos
critérios (indicadores) que revelam o tipo de abordagem do tema na tentativa de
evidenciar as diferenças fundamentais nos enfoques dados pelos autores, e,
critérios (indicadores) através dos registros de representação para verificar
se os autores exploram a coordenação dos mesmos.
Inicialmente
valemo-nos desses critérios (indicadores) na tentativa de analisar a primeira
questão – Que diferenças fundamentais
são evidenciadas no enfoque dado por diferentes autores? – a fim de
verificar como o TFC é apresentado no que diz respeito:
1)
à contextualização;
2)
se partem de casos particulares aos casos gerais ou
vice-versa;
3)
a condições de existência;
4)
à questão da continuidade e integrabilidade;
5)
à referência da inter-relação da derivada e integral;
6)
à demonstração;
7)
às aplicações: práticas e/ou intrínsecas à matemática
8)
aos exemplos e exercícios
Em seguida,
na tentativa de analisar a segunda questão, utilizamos critérios (indicadores)
através dos registros de representação semiótica, para verificar se os autores,
nos livros, propiciam a coordenação entre os registros:
A)
simbólico (correspondendo ao numérico e ao algébrico);
B)
figural (correspondendo ao gráfico e ao geométrico);
C)
língua natural; e
D)
tabela.
Em cada
registro considerado, buscamos descrever os tratamentos envolvidos.
A ênfase
dessa análise foi dada à apresentação do TFC, procurando investigar como o
assunto é introduzido, como os exemplos são tratados e quais as características
das listas de exercícios.
DESENVOLVIMENTO
Nesta parte,
apresentamos um resumo da análise (ainda superficial) dos livros escolhidos,
além das comparações entre eles. Esta análise se dará em duas partes: a
primeira tratando dos aspectos relacionados aos critérios (indicadores) que
revelam o tipo de abordagem do tema estabelecidos na apresentação do TFC: 1)
contextualização; 2) se partem dos casos particulares aos gerais ou vice-versa;
3) condições de existência; 4) a questão da continuidade e integrabilidade; 5)
referência sobre a derivada e a sua inter relação com a integral; 6)
demonstração do teorema; 7) aplicações: práticas e/ou intrínsecas à matemática;
8) finalidade dos exemplos e exercícios. A segunda parte abordará a coordenação
entre os registros de representação: A) simbólico (correspondendo ao numérico e
ao algébrico); B) figural (correspondendo ao gráfico e ao geométrico); C) em
língua natural e D) tabela, já apresentados na Fundamentação Teórica.
Primeira parte – critérios que revelam o tipo de abordagem do tema
Lima: Existe uma contextualização dentro da própria matemática. O autor parte
de casos mais gerais para os casos mais particulares (quase não os menciona).
No texto, não faz comentário ou referência explícita sobre a conexão entre
Derivada e Integral. A demonstração do TFC faz referência explícita à partição
do intervalo e à utilização do Teorema do Valor Médio. Quanto às aplicações,
são todas intrínsecas à própria matemática. Os exemplos não privilegiam técnicas,
mas sim esclarecimentos sobre o tema. Os exercícios privilegiam demonstrações,
sendo que nenhum privilegia a técnica de integração.
Guidorizzi: O autor parte dos casos mais gerais para os
casos mais particulares, buscando condições de existência para que o teorema
possa ser utilizado. O autor parte das funções integráveis para depois
particularizar o TFC para as funções contínuas. Não faz referência à
inter-relação Derivada-Integral. Os exemplos da página 305 e 306 privilegiam
apenas técnicas, abordando apenas funções elementares e todas contínuas. Os
exercícios da página 306 a 308 só privilegiam o uso da técnica para cálculo de
integrais imediatas e as funções são
todas contínuas no intervalo de integração. As aplicações práticas são abordadas nas páginas 308 a 315 (cálculo
de áreas e aplicações à Física na parte de Mecânica – deslocamento de uma
partícula sobre o eixo 0x). Entre as páginas 316 e 324 o TFC é utilizado na
demonstração sobre “mudança de variável”, ou seja, uma aplicação intrínseca à
matemática.
Stewart: Sobre a apresentação do TFC, a contextualização é feita através de texto
que coloca a inter-relação entre a Derivada e a Integral, além de um dado
histórico que atribui a Isaac Barrow a descoberta da relação entre o problema
da reta tangente e o problema da área. A contextualização é feita também
através da introdução da função integral para motivar a apresentação do TFC. São usados gráficos
para que o leitor se convença de que a diferença entre as áreas é aproximadamente a área do
retângulo h.f(x)). O TFC parte do caso particular de funções contínuas – não
coloca casos mais gerais relativos à função ser integrável e possuir uma
primitiva e nem casos de descontinuidades finitas. O autor faz referência (pelo
menos três vezes no texto) sobre a Derivada e sua inter-relação com a Integral
no que diz respeito ao TFC. Quanto às aplicações, elas são bem diversificadas.
Exploram tanto a parte prática (na página 404 e 405 escreve sobre várias
aplicações) como a parte que se refere à própria matemática (usa o TFC para
demonstrar outros resultados, por exemplo, a regra da substituição e cálculo de
áreas). Os exercícios são bem diversificados, vão desde cálculos e aplicações
de técnicas às aplicações práticas. Poucos exercícios ou quase nenhum privilegiam
a demonstração.
Moise: Analisando a apresentação do TFC quanto aos
critérios estabelecidos na página 6, a contextualização não existe – o autor
apenas demonstra o TFC. No texto da página 250 apenas coloca “versatilidade do
método”, “aplicação do método”, ou seja, sugere novamente que o texto
privilegia basicamente o uso de técnicas. O autor coloca apenas casos
particulares de funções contínuas. Não escreve sobre funções integráveis que
possuem primitivas ou funções com descontinuidades finitas – não explicita
condições de existência da primitiva. Com relação à referência sobre a Derivada
e sua inter-relação com a Integral, o autor não chama a atenção para essa
inter-relação. A demonstração do TFC parte da função área f (x) = integral de f (t) dt e do conhecimento de
que f ' (x) = f (x). Utiliza o fato de que duas primitivas de f diferem por uma
constante, além de substituir os limites de integração por “a” (pois F(a) = 0)
e por “b” (no limite superior). Quanto às aplicações, o autor coloca apenas
aquelas relativas à própria matemática (o que chamamos de aplicações
intrínsecas à matemática), ou seja, utiliza o TFC apenas para demonstrar outros
teoremas e para obtenção de primitivas (aqui há um excesso de exercícios). O
objetivo dos exercícios é aprimorar a técnica de integração. Os exemplos também
primam por esse caminho.
Segunda parte
– critérios através dos registros de representação semiótica de Raymond Duval
Lima: A demonstração é colocada,
predominantemente, no registro simbólico algébrico. Em algumas partes o autor
escreve palavras e não símbolos da lógica. Em uma primeira análise percebemos
que o texto sugere pouco a coordenação entre os registros de representação,
ocorrendo basicamente entre o registro simbólico algébrico e o registro em
língua natural. A coordenação entre os registros gráfico e algébrico só é
sugerida no exemplo 8 (página 255).
Guidorizzi: Em uma primeira análise, notamos que a
coordenação dos registros é explorada na apresentação do TFC apenas nos
registros algébrico e em língua natural. Já os exemplos e os exercícios
privilegiam os registros algébrico e gráfico. Não existem conversões do tipo
não-congruente (passagem de um registro ao outro de forma não espontânea, não
natural). Apesar do autor utilizar dois registros pelo menos, o texto não
ressalta muito a importância da coordenação entre os registros de
representação.
Stewart: Uma primeira análise evidencia que a
apresentação do TFC é marcada basicamente pela coordenação entre os registros
algébrico (predominante) e língua natural. Os registros gráficos são utilizados
em partes das demonstrações. As conversões basicamente são do tipo congruente,
e não existem conversões do tipo não-congruente (passagem de um registro ao
outro de forma não espontânea, não natural), nem nos exemplos. Os exercícios
são variados e carecem de melhor análise.
Moise: Através dessa primeira análise, notamos que
a coordenação entre os registros de representação são evidenciadas apenas na
apresentação do TFC, antes mesmo dele ser enunciado. Não verificamos conversão
do tipo não-congruente. Os exemplos e exercícios não sugerem a utilização do
registro gráfico e nem em língua natural (com uma exceção na página 267 – que
sugere o registro gráfico em seu enunciado e o registro em língua natural em sua
resolução). Os tratamentos são feitos basicamente através do registro de
representação algébrico.
Esta é uma primeira apreciação dos livros. A
partir destas, vamos fazer uma análise minuciosa no que diz respeito aos
critérios (indicadores) estabelecidos.
CONCLUSÕES
As primeiras
análises dos livros, relativas às diferenças
fundamentais que são evidenciadas no enfoque dado por diferentes autores,
relativo ao Teorema Fundamental do Cálculo, revelam que Lima e
Guidorizzi trazem uma contextualização apenas intrínseca à própria matemática.
Os dois textos partem de casos gerais (funções integráveis, segundo Riemann)
para casos particulares (funções contínuas), quase nem tratados por Lima. Referente
a condições de existência da Integral, Lima e Guidorizzi apresentam funções
integráveis que possuem primitiva. No que tange à continuidade e à
integrabilidade, Lima não expõe apenas essa questão como também aborda a mesma
de uma forma mais detalhada e explicita no texto. Já Guidorizzi não aborda essa
questão na apresentação do TFC, não as diferencia, apenas escreve que no
apêndice provará que toda função contínua é integrável. Ambos os autores não
fazem comentários ou referência sobre a inter-relação Derivada e Integral como
operadores inversos. Sobre as demonstrações, partindo da definição de Integral
como limite de uma soma (no caso de Guidorizzi) e de Integral como igualdade
entre somas superiores e somas inferiores (no caso de Lima), ambos utilizam a
noção de partição de um intervalo e o Teorema do Valor Médio. Referente ás
aplicações do TFC, Lima trata apenas daquelas intrínsecas à própria matemática,
que são relativas à demonstração de outros teoremas. Guidorizzi por sua vez,
trata em seu texto, também das aplicações intrínsecas à matemática, mas
diferentemente de Lima, trata daquelas para a obtenção da primitiva, cálculo de
áreas e/ou volumes. Guidorizzi aborda também aplicações à Física dos movimentos.
Por último, no diz respeito aos exemplos e exercícios, Lima privilegia
demonstrações, sendo que nenhum utiliza técnicas de integração (obtenção de
primitiva e cálculo). Já em seu livro, Guidorizzi faz predominar técnicas
(obtenção de primitivas e cálculo da Integral) utilizando apenas funções
contínuas.
Stewart
contextualiza as noções relativas ao TFC por meio de um pequeno texto que
ressalta sobre a inter-relação entre a Derivada e a Integral. Escreve uma nota
histórica e introduz o assunto através da função integral (área). Moise, no que
diz respeito à contextualização, introduz a Integral e o TFC em forma de ‘espiral’,
ou seja, as idéias mais difíceis são apresentadas em ordem crescente de
dificuldade, generalidade e exatidão. Essa contextualização, entretanto, é
intrínseca própria matemática, ou seja, não trás rudimentos da história e nem
apresenta o assunto por meio de resolução de problemas. Os dois textos (Stewart
e Moise) introduzem o TFC a partir de casos particulares (funções contínuas),
não mencionando grupos mais gerais de funções (integráveis). No que tange a
condições de existência da Integral, ambos os textos não tratam sobre essas
condições, ou seja, os autores não ‘dão pistas’ para que o assunto seja
percebido – o que existe são apenas funções contínuas. Referente à continuidade
e Integrabilidade, ambos se restringem, como já foi escrito, às funções contínuas.
Vale ressaltar que Stewart, em apenas um exemplo (pág 397, ex.: 8), apresenta
uma função descontínua em um intervalo. Com relação à conexão entre a Derivada
e à Integral, Stewart (pelo menos três vezes) faz referência, explicitando essa
inter-relação (operações inversas). Moise não escreve sobre essa inter-relação,
apenas apresenta tabelas de primitivas que sugerem tal relação. Sobre a
demonstração do TFC, Stewart apresenta: parte1: utiliza as propriedades da
integral, as propriedades dos limites e o teorema do confronto; e parte 2:
utiliza o fato de que duas primitivas de f diferem por uma constante, usa a
parte 1 do TFC, além de substituir os limites de integração por “a” (pois, F(a)
= 0) e por “b” (no limite superior). Em Moise, o TFC não vem apresentado em
‘duas partes’, mas é praticamente idêntica à forma mostrada por Stewart na
parte 2. Em seguida, relativamente às aplicações, Stewart apresenta-as de forma
diversificada. Exploram tanto a parte de resolução de problemas, como a parte
que se refere à própria matemática. Moise, por sua vez, mostra aplicações
intrínsecas à matemática (obtenção de primitivas e cálculo da Integral).
Referente aos exemplos e exercícios, Stewart os apresenta de forma bem
diversificada, vão desde cálculos e aplicações de técnicas às aplicações
práticas. Alguns exercícios privilegiam a demonstração. Em Moise, os exemplos e
exercícios objetivam a utilização das técnicas de integração.
Apresentamos
agora conclusões superficiais (a pesquisa está em andamento) no que se refere à coordenação dos registros de representação
semiótica. Essa coordenação é explorada pelos autores na apresentação do TFC?
Lima utiliza o registro algébrico
predominantemente. Emprega o registro língua natural na apresentação do TFC. O
livro é indicado para alunos que já possuem um curso inicial de cálculo, talvez
por isso o autor quase não recorra ao registro gráfico. Apesar disso, o autor
propicia a coordenação dos registros algébrico (neste ele faz os tratamentos) e
língua natural como registro de representação auxiliar. Guidorizzi faz uso do
registro algébrico predominantemente. O registro gráfico é não é explorado na
apresentação do TFC. O autor não propicia a coordenação dos registros na
apresentação, nos exemplos e também nos exercícios. Stewart utiliza os
registros algébrico, gráfico e língua natural em proporções mais parecidas.
Propicia a coordenação dos registros de representação. Emprega o registro
algébrico para os tratamentos e o registro gráfico como auxiliar. Moise emprega
os registros simbólico algébrico, figural gráfico e língua natural proporcionalmente.
O autor faz os tratamentos no registro algébrico e utiliza a língua natural e o
registro gráfico (em menor proporção) como registros auxiliares para propiciar a
coordenação dos registros.
BIBLIOGRAFIA
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